sexta-feira, 5 de abril de 2013

Se escrevo


Se escrevo

Como pode ser aqui que escrevo? Se mal posso acender a luz. Se mal há espaço sobre a mesa para uma folha de papel em branco. Sim, para uma virgem e branca folha de papel.
Como pode ser aqui que escrevo? Se cada letra traçada solta gritos. Se cada pensamento estala as ferraduras ao cavalgar por essa cabeça miúda em forma de curral. Se ao olhar para os lados lanço chamas.
Como pode ser aqui que escrevo? Se na sala há uma cama. Se no quarto há uma mesa. Se o cômodo é único e o espaço é coletivo.
Como pode ser aqui que escrevo? Se mal posso beber um café a hora desejada. Se o sabor de qualquer torrão vai impregnar almofadas e pijamas. Se mal posso abrir a porta, convidar a lua e antes de lhe falar pigarrear para limpar a garganta.
Como pode ser aqui que escrevo? Se mal posso ler uma poesia em voz alta. Se não posso falar mal de ninguém, pela razão de não poder falar nada. Ah, se o silêncio me doesse! Estaria agora aos berros a procura de um analgésico.
Como pode ser aqui que escrevo? Se falo mal essa língua sem batismo. Se ao meu redor todos roncam. Se meus sonhos só me servem quando acordo, se escrevo.

Rafael Alvarenga
Resende, 28 de março de 2013

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