domingo, 21 de abril de 2013

Chuva na cidade

Chuva na cidade

Fui na chuva mesmo. Mas encurtei o passo. De modo que coubesse sob o guarda-chuva. Aos poucos descuidei dos calcanhares. E por eles principiou meu alagamento.
Os pingos faziam as poças borbulharem. Não havia sequer perspectiva de estiagem. E também não havia quem se preocupasse comigo.
As cidades não foram projetadas para os dias de chuva. Pois empoçam a frente dos pontos de ônibus. E se encolhem. Marquises curtas. Chão torto. Mas as folhas das árvores tilintantes! Lavadas e verdadeiramente verdes.
Votei na chuva. O passo relaxado. O guarda-chuva dobrado. De modo que coubesse dentro da mão pelo cumprido. Os pés corajosos vasculhando as poças. Lá também meu retrato. Uma expressão desfigurada. Tentando sorrir. Tentando encontrar algum encanto.
Cuspiam no chão as árvores. Zombando de minha condição. Batiam os galhos. Tais bêbados recostados num balcão. Ficavam ali plantadas. Falando de coisas que se iam esquecer nas ventanias fortes da ressaca.
 A cidade então ficava obesa. E lenta. Pois as cidades não foram projetadas para os dias de chuva. É que os urbanistas e paisagistas e arquitetos e engenheiros civis nunca pensaram que pudesse haver chuva na cidade. Que pudesse haver água. Desse tipo que cai sem escorrer por tubos e torneiras. Desse tipo que não se controla nem por orações.
Cheguei na chuva. E minha casa seca, séria, sóbria. Não tinha nenhuma beleza que me consolasse.

Rafael Alvarenga
Resende, 08 de abril de 2013

Um comentário:

  1. Meu caro Rafael, uma boa reflexão sobre a chuva na cidade, além do que, uma boa chuvarada lava a alma da gente...em vários sentidos, valeu!

    forte abraço
    C@urosa

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