Chuva na cidade
Fui na chuva mesmo. Mas encurtei o passo. De modo
que coubesse sob o guarda-chuva. Aos poucos descuidei dos calcanhares. E por eles
principiou meu alagamento.
Os pingos faziam as poças borbulharem. Não havia
sequer perspectiva de estiagem. E também não havia quem se preocupasse comigo.
As cidades não foram projetadas para os dias de
chuva. Pois empoçam a frente dos pontos de ônibus. E se encolhem. Marquises
curtas. Chão torto. Mas as folhas das árvores tilintantes! Lavadas e
verdadeiramente verdes.
Votei na chuva. O passo relaxado. O guarda-chuva
dobrado. De modo que coubesse dentro da mão pelo cumprido. Os pés corajosos
vasculhando as poças. Lá também meu retrato. Uma expressão desfigurada.
Tentando sorrir. Tentando encontrar algum encanto.
Cuspiam no chão as árvores. Zombando de minha
condição. Batiam os galhos. Tais bêbados recostados num balcão. Ficavam ali
plantadas. Falando de coisas que se iam esquecer nas ventanias fortes da
ressaca.
A cidade
então ficava obesa. E lenta. Pois as cidades não foram projetadas para os dias
de chuva. É que os urbanistas e paisagistas e arquitetos e engenheiros civis
nunca pensaram que pudesse haver chuva na cidade. Que pudesse haver água. Desse
tipo que cai sem escorrer por tubos e torneiras. Desse tipo que não se controla
nem por orações.
Cheguei na chuva. E minha casa seca, séria, sóbria.
Não tinha nenhuma beleza que me consolasse.
Rafael Alvarenga
Resende, 08 de abril de 2013
Meu caro Rafael, uma boa reflexão sobre a chuva na cidade, além do que, uma boa chuvarada lava a alma da gente...em vários sentidos, valeu!
ResponderExcluirforte abraço
C@urosa