Coisas e palavras
Numa mão levo as palavras. Na outra as coisas. Fico
de pé. Faço malabarismos circulares. Embaralho coisas e palavras. Engano. Abuso
da confiança de vocês. Faço parecer que as palavras e as coisas sempre
estiveram siamesas. Faço parecer que dividiram o mesmo útero primitivo.
Também quem vai me desmentir se as coisas jamais
falaram. Então quem fala sou eu: A maçã está na fruteira. A fruteira é verde
com flores azuis. E as formigas passeiam em busca do doce resto de banana que
seca na base do cacho maduro já quase todo devorado. E o cheiro de bolo chega
rolando pelo ar. O palito de fósforo penetrou-o para saber da secura de suas
entranhas. Está no ponto. Sai brilhoso do forno. Abandona inteiriço a forma. A
faca brilha. Em seguida mutila o primeiro pedaço.
Se tivesse apenas dois braços não conseguiria jogar
tantas coisas e palavras. Nunca parei para contar quantos braços tenho. Ou
quantas palavras ligo a quantas coisas. Às vezes repito, tudo bem. Mas não há
quem se importe. Quem se importa com os nomes das coisas? Apenas quem cria os
nomes das coisas.
Tenho nove braços. Um perdi brincando com palavras
afiadas. Outro perdi quando palavras muito pesadas lhe caíram em cima. Outro à
toa. Por risco bobo de palavra de fogo.
Rafael Alvarenga
Resende, 08 de abril de 2013
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