terça-feira, 5 de março de 2013

Poesia na noite preta e velha


Poesia na noite preta e velha

Nos deitamos. A noite corria alta e silenciosa. Ela acordou o livro qual dormia entre nós e pegou a ler. O mundo todo escuro. E nosso abajur aceso marcando uma espécie de estrela na cabeceira do nosso universo.
Enquanto ela lia eu fechava os olhos. E brincava de sonhar. E nos meus sonhos quanta poesia. Quanto esplendor! Quando terminava de ler eu despertava. Na boca um sabor de fundo de sono. Nos olhos um arregalo pasmado. E se andasse o tempo um pouco mais devagar eu teria perguntado que lugar seria esse. Sonhar é como perder o equilíbrio.
A voz dela coava as palavras. E para o copo dos meus ouvidos chegava uma mensagem com cor e cheiro. Às vezes com sabor de café preto; ás vezes com barulho de faísca elétrica de bonde antigo. Isso tudo dormia dentro de páginas finas e claras. Como a água de um rio, fina e clara. As páginas virando, correndo, descendo. E delas não podiam escapar as letras. Pois escapar lhes arrancaria as vidas que por mão do poeta eram todas poesia.
Se eu pudesse contar tudo que ganhava ouvindo aquela voz me recitando estrofes na noite preta e velha. Não posso contar. Não posso medir. Por mais cheio de números que fosse o número final. Porque quando falasse, quando contasse, faltariam palavras para alongar as pernas da mentira. Faltaria tempo para ouvir mais poesia na noite preta e velha.

Rafael Alvarenga
Resende 26 de fevereiro de 2013

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