Folhinha
Pediu-me que comprasse o pão. E aproveitasse a
visita à padaria para pedir uma folhinha. Afinal, o ano próximo estava às
vésperas de rebentar em dias moços.
Cada um é filho de sua época.
Os mais jovens sacam dos bolsos calendários
infinitos e virtuais. Capazes de orçar datas de um ano quando nenhum de nós
estará mais aqui. No entanto, outros são de um tempo quando o calendário era de
papel. Cada folha exclusivamente dedicada a um mês do ano. Onde, a cada trinta
dias, também se associava uma gravura, uma fotografia, uma pintura. O
calendário de folhinha era uma verdadeira obra de arte.
Lembro-me de haver neles sempre manadas de corcéis rasgando
o vento; sabiás de peitoral bem definido; ou uma cesta de pães bronzeados.
A folhinha era uma lembrança e um agradecimento que
os estabelecimentos ofereciam a seus fregueses e amigos. Mesclavam utilidade e
beleza com fôlego capaz de durar o ano inteiro. E era ali, sobre o papel, que
se comentavam os aniversários de parentes, bem como se agendava eventos e
consultas médicas.
De minha parte, o que mais gostava, era fazer o “X”
sobre o dia morto. Sepultando o tempo me cria forte como os heróis dos desenhos
animados. Vovó consentia meu rabisco. Não se incomodava. Afinal, para ela, o
calendário era somente o tempo.
Rafael Alvarenga
Niterói, 11 de dezembro de 2012
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