sábado, 15 de dezembro de 2012

Cama na Varanda


Cama na varanda

Então fiz a cama na varanda. E aos olhos caseiros isso soava bizarro. Como se fosse impraticável adormecer desembaulado. Como se houvesse risco na grama do nosso quintal. Desinformados! Hoje em dia até os jornais noticiam a extinção de nossos mais preciosos e famintos predadores. Da fauna brasileira restou apenas nós mesmos: mancos e anêmicos bípedes.
Nessa noite, ao invés da penumbra dos móveis caía sobre meu descanso o fulgor das estrelas. E só assim eu vi a açaizeiro cabeludo em pé a um canto do pomar. Foi quando o vento correu rebocando nuvens; alegando uma escuridão inopinada. Minha cabeça quase me empurrou para debaixo do alpendre. Espécie de fraqueza automática.
As nuvens eram um pedaço de parede chapiscada. De algum lugar sagrado ruíam muros e divisórias. Em algum lugar sagrado não haveria mais confidências. Dormiriam todos sem a proteção dos limites. Com sonhos que nada querem ter, mas que tudo podem ser.
Aguardei a chuva. Cruzei as mãos sob a nuca. Soltei os olhos pelas órbitas. Apalpei o chão com a sola dos pés. Assobiei para o vento e veio nosso cão. Lambeu-me os braços. E como um feiticeiro, bocejou para o alto num sinal oculto. Foi assim que desmanchou a ventania, as nuvens e a minha vigília.

Rafael Alvarenga
Niterói, 11 de dezembro de 2012

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