Uma galinha gorda
Veio me perguntar se gostava de galinha caipira. Eu
pensei logo nos molhos pardos que há tanto não via mais. Respondi
afirmativamente junto a um sorriso bojudo. Pois então ela me disse que traria
uma galinha bem gorda. Diminuí um pouco o sorriso em vista do adjetivo dado à
ave. Mas agradeci. Na verdade, por um átimo, lembrei-me de minhas artérias
ainda jovens. Talvez com medo de senti-las entupidas. Podia ser uma galinha
magra, ainda que com alguma carne, pensei em dizer. Não disse nada. Não
adiantaria nada. Ela estava tão alegre, e me agradecia tanto, que jamais me
presentearia com uma galinha magra. Seria uma galinha caipira, e bem gorda.
Senti uma fanfarrona fisgada no peito. Alguma artéria
noticiando sua fragilidade.
Era melhor frisar que eu não fazia nada de mais.
Eles é que me faziam um enorme favor. Pois o material que recolhiam não me
tinha mais serventia. Era um estorvo! E eu, debilmente paralisado, encontrava
neles uma solução. Levavam o que eu precisava que fosse levado. Eles é que me
faziam um favor!
Eu tentava explicar essa inversão dos agentes
favorecidos. Mas eles carregavam tábuas, escoras, mourões, ripas e estacas. E
todas as vezes que passavam por mim, prostrado com os braços pendurados na
cerca, me lembravam da galinha gorda.
Diziam-me que com aquele material levantariam sua
primeira casa própria. E assim, seriamente felizes, me agradeciam com a firmeza
do suor que lhes escorria pelas faces. Pensei em dizer que eu não podia com
gordura. Determinação médica.
Fiquei refletindo, longe de qualquer ação; e eles me perguntaram se
podiam levar algumas latas vazias de tinta. Claro que podiam. E recomeçaram a
me agradecer, sem me deixar explicar que eles é que me faziam um favor. Davam
glória aos céus por terem me encontrado. Abençoavam meu nome. E afirmavam com a
rigidez de quem cumpre: Vamos trazer pro senhor uma galinha gorda.
Rafael Alvarenga
Itatiaia, 04 de agosto de 2014
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