terça-feira, 13 de setembro de 2016

Onde está a liberdade?



Nasceu peixe e por isso tudo o que fazia era peixisse. No início da vida nenhum incômodo lhe abatia. Escamas amarelas reluzindo feito ouro unidas à força da juventude o confundiam a um raio percorrendo o fundo do mar. E não havia quem não se impressionasse: peixes, crustáceos e seres humanos se encantavam até com o movimento das guelras.
Mas foi como sempre foi. Nasceu peixe. E quando miúdo nadava pelas cercanias de pedras e corais. Não por temor, é que a sobrevivência valia qualquer coisa, inclusive passar por covarde. No entanto vamos pular essa parte. Pois o peixe cresceu como peixe e aos poucos percebeu que ainda que fosse mais rápido e bonito era um peixe como todos os outros. E de nada adiantaria o querer, pois não podia fazer nada que não estivesse dentro das opções de peixisse do seu indicador de peixe. E como aquilo lhe massacrava a carne foi em busca de saber se todos eram assim.
Não demorou para descobrir que siri só fazia coisas de siri; que anêmona só fazia coisas de anêmona; que plâncton só fazia coisas de plâncton e que também os tubarões só faziam coisas de tubarões. Ninguém no fundo do mar podia, tampouco conseguia ou precisava, fazer coisas que não fossem coisas suas. Descobriu que não havia liberdade. Ora uma palavra tanto usada mesmo no fundo do mar. Pensou em fazer uma grande reunião e explicar a todos que ali viviam sobre a inexistência dessa coisa tão querida chamada liberdade. Porém aquilo o inquietava. Não era possível! Devia haver liberdade em algum lugar.
Pensou em peixe voador, mas logo descobriu que eles só podiam viver daquela maneira de peixe voador. Pensou até em maré vermelha, para rapidamente perceber que ela não poderia ser de outra cor. As coisas são como são e não há forma de não serem assim.
Ah! Resolveu estudar a vida dos pássaros. Talvez não houvesse liberdade apenas no mar. Coitados dos seres marinhos! Entretanto percebeu que o problema não estava circunscrito à água. Quase foi levado pelo bico por um mergulhão. Era assim com eles também. Um mergulhão não podia fazer como faz uma tartaruga. O problema era geral. Realmente não havia essa coisa chamada liberdade.
Foi o peixe nadando tristonho com intuito de convocar a reunião. Todavia, antes que o fizesse, lembrou-se de um último animal ainda não observado. Era o Homem. E começou a pontuar: Ele é o único que pode voar, mergulhar, comer carne ou não... é o único que pode fazer novas regras e repensar seu modo de ser humano.
Tanto aquela ideia o alegrou que girou as nadadeiras em alta velocidade a fim de convocar a reunião para dar uma boa notícia. Foi quando deu de cara com um amontoado de lixo. Produção humana; uma espécie livre que pode fazer diferente, mas não faz.


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