Existem
muitas coisas no mundo que eu não quero mais
Eu não quero
mais seu café adoçado me engrossando a saliva nas primeiras horas da manhã. Não
quero mais seu manjericão sem aroma sobre as rodelas de tomate que eu cortar
para minha salada. Não quero mais suas vírgulas dentadas nas minhas poesias,
até porque eu hesito represa-las inclusive com um pequenino ponto final. Não
quero mais seu pingente da coca-cola no meu chaveiro. Eu detesto coca-cola. Sou
daqueles que preferem a seco. Eu não quero mais você me avisando sobre o
guarda-chuva. Sei que a tempestade é imprevista, mas e daí? Eu me previno e
nunca sinto a sensação de ter escapado por sorte. Eu não quero mais seus
programas românticos nem seus ímãs na minha geladeira. Eu não quero mais suas
músicas porque elas reverberam pelas minhas paredes durante um tempo
incontável. Eu não quero mais ser seu confidente, nem dar conselhos para
problemas insolucionáveis. Eu não quero mais tirar o lixo nem conferir se a
porta dos fundos está fechada depois de já termos deitado. Eu não quero mais
reparar nos cabelos que você cortou ou nas unhas que você pintou de uma cor
cujo nome foi forjado nem nenhum nexo. Eu não quero ter que me lembrar de
nenhuma data ou mesmo responder a sua mensagem de texto. Eu não quero te dizer
que horas são. Não quero te dizer para onde vou quando saio pensando. Eu não te
quero dizer que sou a pior pessoa do mundo. Só quero dizer que existem muitas
coisas no mundo que eu não quero mais.
Rafael Alvarenga
Itatiaia, 13 de março de 2015