quinta-feira, 9 de janeiro de 2014

Quando ele voltou para casa

Quando ele voltou para casa

Chegou a casa sorrindo. Abriu os braços das janelas quando abria seus braços e se abraçaram sem aperto. Passou as mãos pela pele das paredes numa espécie de afago a um ente querido. Não demorou e também olhou nos olhos remelentos do espelho que acordava agora depois de longo sono semanal. Enquanto caminhava pelos cômodos galanteando cada quina desnudava o corpo da casa abrindo as cortinas franjadas. Acendeu as luzes junto com a luz do dia. E encontrou moedas e bilhetes. O calendário envelhecido marcado na parede dobrava seu papel sobre si mesmo se fechando como a concha de um molusco.
Uma prateleira ofereceu de bandeja, alguma garrafa. Aceitou de pronto! Bebeu com a casa toda um gole farto brindando boas-vindas! Estavam juntos novamente. E como se conheciam bem! Afinal, dividia com ela suas mais incomodadas opiniões. Compartilhava inclusive a intimidade de sua tão reservada nudez. Com ela ria e reclamava dos defeitos do mundo. Com ela esperava a tarde cair e a chuva estiar. Sempre fazendo comentários.
Toda aberta a casa respirou profundamente. Ele ainda estava sorrindo. Cultivando um sentimento contente e amplo de quem tinha saudade. E apesar da pressa em arrumar tudo sentou um pouco numa cadeira. Ouviu a voz da casa sussurrando agudo pelo corredor. O paladar da última refeição veio da boca da cozinha. Soube que o sonho do último sono ainda morava ali.
A casa tinha algo que era dele. Circulando nela como sangue. Talvez ela mostrasse quem ele era de um jeito que não o incomodasse. De um jeito caseiro.

Rafael Alvarenga

Resende, 08 de janeiro de 2014

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