domingo, 15 de dezembro de 2013

Terça-feira de verão

Terça-feira de verão

Ela esperou que todo inverno passasse. E nomeou bem uma terça-feira de verão. Era uma noite já iniciada. Mas o calor queimante quase iluminava, quase criava dia sem ofender as estrelas. Eu sabia que ela viria. Aguardei despreocupadamente. Caminhando pelo apartamento como quem caminha em busca de uma brisa.
Tocou a campainha. Ela não ouviu meus passos. Capturei-lhe o corpo todo dentro da forma bojuda do olho mágico. Vinha escondendo apenas o que cismamos não poder mostrar. Imaginei o calor de sua pele e o cheiro natural que lhe caldeirava a nuca.
Ao meu beijo sua boca esteve fria. Amarrada. Quadrada. Sem curva alguma. Perguntei se estava tudo bem. Ela respondeu não, mas que ficaria melhor. Refez o nó dos cabelos. Sentou a bolsa sobre minha mesa. Meus olhos desarmaram-se abandonados e frágeis.
Ela disse não podermos mais. Eu olhei pela janela e na rua alguém passava rindo alto. Como aquilo me penetrou diabolicamente. Ela no sofá com um short que só escondia o que cismamos não poder mostrar. Pensei em ir nadar. O motivo, segundo ela, era ela mesma. Eu estava isento de qualquer conta, culpa ou benefício. Senti-me torto como o armário que acaba de perder o calço que tanto lhe aprumava as quinas.
Ela se foi com a boca fria. Amarrada. Quadrada. Sem curva alguma. Sai à rua. Era ainda terça-feira de verão. Escondiam-se apenas o que cismamos não poder mostrar.
Ainda bem, ela esperou que todo inverno passasse.

Rafael Alvarenga

Resende, 12 de dezembro de 2013 

2 comentários:

  1. Sempre no verão...me fez lembrar do filme Verão de 42 hahahaha.

    forte abraço

    c@urosa

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  2. Muito bom meu velho amigo.
    Grande abraço!!

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