Filme
Na rua. No centro da cidade. A multidão fílmica.
Gravando. Em cena.
Mas é fato real que todos venham e vão. Mesmo não
se gostando. Mesmo caguetando o absurdo do gosto alheio. É controlada a
multidão fílmica.
E se chove são mais civilizados ainda. Ora por que
perdem as ruas e a parte das calçadas cresceram fora das asas das marquises.
Como se viram e se roçam. Como guerreiam os guarda-chuvas. Como caem gotas
mesmo naqueles debaixo das asas das marquises.
Todos ganham algum cachê para figurar. É a multidão
fílmica. Gravando. Em cena.
O patrão é muito esperto. Não é o diretor. Não tem
função alguma. É o dono. Muitos não sabem quanto o outro recebe. Também não
prestam atenção nas camisas, nas pilastras, nos letreiros, nas bancas. Tudo
veste o nome do dono.
Um homem de camisa preta e óculos escuros vai de
braços soltos. Uma mulher magra de camiseta e cabelo amarelos vem segurando a
alça da bolsa que pende do ombro direito. Um menino está parado no meio da
multidão. Só tem sua aparência maltrapilha.
Os prédios formam enormes avenidas de sombra. A luz
sem muito brilho é adequada. A multidão fílmica. Gravando. Em cena. O script
decorado. A produção atenta. O diretor sentado. O dono ninguém sabe.
Cena 1. Take 1. Parte 1. Na rua. No centro da
cidade. A multidão fílmica. Gravando. Em cena.
Rafael Alvarenga
Resende, 26 de outubro de 2013
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