As árvores estão aqui! São duas. Suas folhas é que são muitas. Assim como duráveis. Quando caem podem ser usadas como pratos, abanadores, cinzeiros ou tampas. Estão envolvidas por uma camada siliconada resistente a água e ao sabão. Duram mais que muito plástico descartável apenas pela mão.
Também estão aqui os homens responsáveis pela poda. Um deles precisou
voltar para o lugar de onde saiu e cobrir os braços com um velho casaco de
brim. Os troncos dessas árvores têm cascas que se dividem em pedaços arranjados
em fileiras ao longo de todo corpo vegetal. Se não fosse tão escurecida a sua
coloração eu diria que tem o aspecto do couro de um jacaré. Mas como esse é
verde demais e aquele de um escuro soturno, prefiro não comparar.
São duas as árvores que estão aqui. Uma já está nua. Os galhos mais
baixos que lhe restam servem agora para esconder suas intimidades. Tal como fazem
os humanos quando estão nus em público, uma mão na frente outra atrás. Agora
creio que a comparação ajuda o leitor.
A árvore que ainda não foi podada não sabe o que dizer a amiga. Afinal,
ninguém veio antes perguntar se ela queria que passassem mesmo a máquina zero.
Os homens responsáveis pela poda agora conversam. Falta pouco para as
cinco da tarde nesse inverno. Aqui no pátio temos agora dois momentos de um
mesmo dia. Sob a árvore careca ainda é dia. Sob a cabeluda já é noite de
solstício.
As árvores estão aqui! E também está a dúvida que me levou à crônica:
Há hoje, na minha frente, uma árvore que é mais árvore que a outra?
Rafael Alvarenga
Cabo frio, 21 de junho de 2022